Quis estar e estive presente na aula sinodal e na celebração da abertura do Sínodo, dias 9 e 10 de outubro. Considero acontecimento histórico fundamental, como referi nos trabalhos de grupo. Sinto um sopro renovador, em hora de uma encruzilhada muito complexa na vida da sociedade e sobretudo da Igreja. Em tempo de uma secularização galopante, onde Deus não conta; em momento de alteração migratória, só comparável com o século V, nas chamadas invasões de povos germânicos ou bárbaros; em hora de uma cultura digital e crise ecológica, com novas tecnologias a comandar o futuro, que resposta encontrar em partilha que escuta todos os níveis de crentes e mesmo não crentes?
A dimensão sinodal da Igreja e a atenção a algumas práticas concretas tem ocupado teólogos e teólogas há vários anos. O Papa Francisco decidiu escolher para tema do Sínodo de 2021-2023 esta dimensão da Igreja como Povo de Deus, onde todos são convocados e envolvidos. Lembrei-me de ter colocado na pagela, do início do meu ministério presbiteral, a frase: “Creio na Igreja povo de Deus, corpo de Cristo e templo do Espírito Santo”. Significava um percurso espiritual para eu aceitar ser padre. Daí a alegria enorme quando verifico que não são palavras, mas vida.
Sinodalidade, caminhar em conjunto, pode parecer mais um slogan de uma igreja aflita, à procura de palavras ou fórmulas cativantes. Não é. Nem é uma poção mágica para resolver os intrincados problemas e curar as chagas da Igreja católica. Nada disso. A igreja das origens tinha um estilo sinodal, uma forma comunitária para discernir os passos a dar, em ordem a escutar o que Deus quer e o Espírito Santo indica como missão. É dimensão constitutiva, apontada no II Concilio do Vaticano, mas pouco praticada.
As mudanças de mentalidade que se exigem são profundas, mas emociona saborear o sonho de uma Igreja mais sinodal e acende a vontade para deitar mãos a empresa essencial. Saltar de paróquias que nem conselho económico têm, embora obrigadas pelo Código de Direito canónico, para uma igreja onde todos são ouvidos, envolvidos e chamados à missão, quanto caminho não requer!
Pode começar a aborrecer ouvir repetidamente falar de sinodalidade como panaceia de todas as angústias ou estrangulamentos institucionais da Igreja. Será a resposta possível a séculos de inércia? Não. Não é parlamento, nem rápida lavagem democrática, como salientou o papa. A Igreja é verdadeiramente constituída por todos os batizados, em diálogo com todos os povos, culturas e religiões.
Vamos a isso, porque o Espírito Santo anda impaciente, por andarmos entretidos com aspetos secundários. Importa uma cultura de silêncio, de abertura a uma conversão espiritual básica, ao Evangelho e ao estilo de Jesus.
Por D. Carlos Moreira Azevedo * bispo delegado do Conselho Pontifício da Cultura, no Vaticano.
Texto publicado nas redes sociais do autor.
Foto: Agência Ecclesia