O clericalismo não é sinodal

“A sinodalidade rompe com todo clericalismo eclesial, concede aos leigos e demais comunidades um papel de protagonismo na Igreja, num clima de diálogo, consulta e escuta. Daqui surge a importância do diálogo entre a Igreja universal e Igrejas locais, um diálogo intercultural e inter-religioso, um diálogo entre a universalidade e as particularidades geográficas, históricas, culturais e religiosas.

Neste caminhar sinodal entre as Igrejas e as religiões há de existir uma especial solidariedade com os membros mais pobres e excluídos da sociedade, e escutar a sua voz, pois eles constituem um verdadeiro lugar teológico (EG 126).

A sinodalidade tem hoje também repercussões ecológicas pois fazemos todos parte da mesma casa comum e caminhamos juntos com toda a criação na plenitude escatológica, a terra deseja ser libertada das suas dores de parto que agora sofre (Romanos 8, 20-27) e temos que superar o paradigma antropocêntrico e tecnocrático que destrói a criação (Laudato si`).

Digamos finalmente que sinodalidade e pneumatologia estão tão estreitamente conectadas, que, quando escurece a pneumatologia, escurece a sinodalidade eclesial. O Espírito está sempre atuando na Igreja e na sociedade, um Espírito universalista e pluralista, como se revelou no Pentecostes, contrário a Babel, que é idolatria de uma uniformidade excludente. O Espírito ordinariamente atua desde baixo, desde os pobres, desde a profundidade da história”[1]

Acabei por citar estes quatro parágrafos dado que me parecem bem contundentes e explícitos sobre o Sínodo 2023, tanto mais que hoje o bispo de Roma e papa Francisco acaba de sentir que a Igreja é culpada, reconhecendo os erros da evangelização por impor um único modelo eclesial, de acordo com a informação da edição on-line do jornal, edição digital, “Vida Nueva”.

Distingo dos parágrafos publicados que em primeiro lugar o “clericalismo” – diferente do clero -, é um cancro que convém extirpar, dado controlar com o seu poder as pessoas e as instituições. Ora, o não-controlo, por exemplo, a não nomeação consecutiva das pessoas que lhe são afetas e que dizem sempre “o senhor padre é que sabe”, é condição indispensável para ouvir ativamente as mulheres e os homens que têm estado amordaçados com a pregação de “um inferno ou um purgatório”. É preciso, antes de ouvir as pessoas, libertá-las deste catastrofismo que, não ingenuamente, o clericalismo tem inculcado nas multidões anónimas e que nunca se fazem ouvir.

Mas a sinodalidade é, também, ecológica na audição do grito da terra e no grito dos pobres, e a Igreja se faz “ouvidos moucos” a esse clamor, nunca irá conseguir que a Palavra de Deus seja evangelizadora. Os pobres, os amordaçados, os espezinhados, os sem-nada, não podem continuar a não ter voz, por mais sábias que sejam as palavras dos cardeais e bispos reunidos em Roma; se não tiverem voz, então o Sínodo para nada serviu.

Por outro lado, a sinodalidade só tem concretização com o Espírito de Deus – pneumatologia -, e se não estiver ligado a ele, de nada serve ser sinodal. Caminhar juntos, é com este Espírito de Deus que sopra antes do mais pelos amaldiçoados da sorte, pelos excluídos pela Igreja ou pela sociedade. O Espírito não é domável, nem faz parte do clericalismo, mas fala às mulheres e aos homens através de muitas formas, que até podem nem ser sinodais ou cair nos regulamentos dos sínodos.

Esta última particularidade do Espírito de Deus atuando na Igreja, mas muito mais na criação, poderá levar um Sínodo a não ter excluídos, começando, desde já, pela nomeação dos responsáveis pela animação ao nível diocesano. Se forem sempre com os mesmos, com os das “sacristias da vida”, então não esperemos que o Espírito se faça sentir, fá-lo-á, certamente, muito mais pelas vozes que nunca serão silenciadas pelo “clericalismo”.

 

Joaquim Armindo  *  Pós – Doutorando em Teologia  *  Doutor em Ecologia e Saúde Ambiental  *  Diácono – Porto – Portugal

 

 

[1] Codina, Víctor (2021). Unidade e Diversidade Eclesial desde o Sínodo da Amazónia. Revista Concilium, n.º 392, setembro 2021. Editorial Verbo Divino. Espanha