“Meu Senhor, se agora acho graça diante dos teus olhos, não te afastes do teu servo” (Gênesis 18: 3), é este o versículo que dá o título à declaração conjunta da Conferência das Igrejas Cristãs e do Conselho das Igrejas Episcopais da Europa, sobre o Tempo da Criação, que decorre de setembro a quatro de outubro, este o dia em que comemora São Francisco de Assis. Passam, assim, a ser dois tempos fortes de união das várias tradições cristãs, onde se inclui a Igreja Católica Romana: a semana de oração pela Unidade dos Cristãos e o Tempo da Criação. Todos nós gostamos de ver a unidade cristã em todos os tempos, na sua pulverização de tradições, e, por isso admitimos que são grandes jornadas com vista à unidade na pluralidade, sem, contudo, termos acesso àquilo que é mais urgente, a celebração eucarística em comum. Por isso, penso que estes tempos – que se façam pelos séculos dos séculos -, traduzem bem que existe divisão naquilo que é essencial, a defesa da Casa Comum. O pedido é lindo: se “acho graça…não te afastes do teu servo”, como prece estamos a pedir aquilo que nós não concebemos o “achar graça”, porque nunca Deus deixou de estar ao lado dos seus servos, nem nunca se afastou; é o que sai do nosso coração para pedirmos uma coisa que temos (não te afastes), e uma coisa que não queremos (achar graça).
Um caminho que há longos anos se descreve, e que não terá qualquer fim, a unidade na diversidade, o “achar graça” diante dos olhos de Deus, até pode parecer um sacrilégio, devido à nossa conduta contra a unidade dos cristãos. Mas não lhes vou chamar tal, seria, também, o que requereria chamar a mim próprio; mas não coloco dúvidas relativamente a um propósito de “hipocrisia” clamar a graça de Deus, para uma reconciliação que não queremos. Ao pedirmos que Deus não se “afaste de nós”, estamos certos de que tudo fazemos para que isso seja uma realidade, o “afastamento de Deus de cada um”, que só não tem efeito porque o Espírito do nosso Deus, tem como habitação cada um dos nossos corpos.
Ao clamarmos logo “Meu Senhor” sabemos que Deus, Nosso Senhor, não nos abandona, mas existe uma traição da nossa parte, para connosco, para os outros e para com a Criação, porque somos nós mesmos que não sabemos o que é o “Meu Senhor”. Se soubéssemos não existiria as frações de cristãos, que se constituem em Igrejas só porque os lugares dos tronos não são infinitos.
A Tenda de Abraão que hoje clamamos como sendo a nossa “Casa Comum”, é, sabemos há muito o que rejeitamos, porque só nos interessa não a unidade em torno da Criação, mas o proselitismo que poderemos fazer em nome de questiúnculas sem qualquer valor de significância para a Salvação. Aliás, o próprio Jesus nos abre as portas da compreensão e do diálogo, que não assenta em pobres divergências, mas no compromisso de sermos Todos Irmãos e Irmãs, unidos num só querer o do recebermos na Tenda de Abraão o desconhecido, sem perguntar o que é e o que quer. Abraão dá o exemplo de receber à sua mesa quem não conhece, não como nós que recusamos a unidade na diversidade à mesa conjunta da Eucaristia, que é o sinal mais candente da unidade na defesa da Casa Comum.
Abraão reconheceu de que quem chegou à sua tenda era o desconhecido, aquele que poderia ter ideias diferentes, que poderia, até, não respeitar a Criação, mas recebeu-o, como quem recebe um seu amigo, insisto, sem perguntar quem era e o que queria, mas sabendo era uma pessoa amada por Deus e, por isso, nada tinha a recear. Não estabeleceu hierarquias, nem poderes de submissão ao outro, foi sem condições. Pois, a atitude de estarmos em conjunto a orar pela Criação, será balofa, sem crédito, enquanto não soubermos que Deus está em cada um e em cada uma.
Que este tempo da criação, seja um entendimento que os cristãos e as cristãs estão por cima dos poderes e sabem que Jesus não se afasta de ninguém.
