A nossa iliteracia bíblica e doutrinal é um perigo

Três notas positivas e propositivas da receção do Concílio Vaticano II em Portugal (I)
1. Em primeiro lugar, a reforma litúrgica, acolhida com entusiasmo e aplicada com equilíbrio, mas que agora nos pede um novo fôlego no campo da formação e da pedagogia, para fazer da Liturgia uma experiência espiritual de participação ativa, consciente e frutuosa, do encontro pessoal com Cristo.
É preciso que a Liturgia não se torne cerimónia religiosa, mais ou menos pomposa, mas celebração do mistério pascal de Cristo, até se tornar uma verdadeira escola permanente da fé do Povo de Deus.
No campo da Liturgia, estamos a caminhar para uma geração de analfabetos da nossa gramática e da nossa linguagem litúrgicas, que permanecerá, cada vez mais, uma língua estrangeira, para os nativos digitais, mesmo se celebrada em português, se não investirmos numa verdadeira mistagogia.
2. Em segundo lugar, registo a redescoberta da Palavra de Deus na Liturgia e na Catequese, a Palavra servida com mais abundância, mas pede-se agora um esforço maior para que a Bíblia deixe de ser objeto de adorno e se torne o livro de oração na vida dos cristãos e das famílias, nomeadamente através da experiência mais alargada da ‘lectio divina’.
A Catequese continua a ser pensada como ação pastoral destinada a crianças e adolescentes e falhámos numa proposta alargada e consistente da Catequese de Adultos, para não falar do quase inexistente caminho catecumenal para os Sacramentos da Iniciação ou para os simplesmente batizados.
A nossa iliteracia bíblica e doutrinal é um perigo, sobretudo numa cultura que prefere a emoção à razão, numa religiosidade intimista, a la carte, ao gosto de cada um.
3. Em terceiro lugar, aprecio como positiva uma maior consciência da comum dignidade de todos os batizados, do sacerdócio comum dos fiéis, do sentido de pertença e de participação de todos os fiéis na vida da Igreja. Mas urge superar o défice de consciência e de experiência missionárias, pois somos mais ativos dentro da comunidade, do que no coração do nosso mundo.
O testemunho público da fé dos cristãos é raro e a maior parte das vezes tímido, diante de uma cultura hostil, mas que ainda valoriza a coerência de vida e uma fé assumida com rasgo e alegria.
P. Amaro Gonçalo Amaro
Pároco da Senhora da Hora, Diocese do Porto
Texto originalmente publicado em”A Igreja em Barroso”, 1.06.2021, p.6, gentilmente cedido ao Religiolook

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